Friday, August 30, 2019

628.


dia 29 de agosto




(Festival) PARAGEM (em modo soft opening)
práticas artísticas contemporâneas em época balnear


Férias Artísticas no Algarve

As artes e contextos de apresentação são lugares e habitações de pensamento que revelam gestos, princípios políticos e filosóficos, marcas de identidade, posições territoriais, compromissos, desafios e acções que incitam, eventualmente, a outras. Talvez seja também essa a felicidade que se pode encontrar num acontecimento artístico, a de levar para casa uma enorme vontade de acção, nem que seja para, quando lá chegarmos, fazer a cama e logo de seguida nos deitarmos nela.”

Nelson Guerreiro, Em que é que as artes contribuem para a minha felicidade? In “ArtInSite”


O (Festival) PARAGEM assentará numa programação multidisciplinar com o objectivo de promover plataformas de acessibilidade, num contexto arredado dos grandes centros, urbanos à cultura e criação artística contemporâneas em época balnear,  desejando, por isso, envolver as comunidades permanentes e temporárias de Lagoa através de uma selecção cuidada de projectos nas áreas da música, teatro, dança e performance, mas também nas artes visuais e outras áreas da criatividade, apostando numa combinação de artistas consagrados e de jovens criadores portugueses e internacionais.

Destaque-se o cariz itinerante do (Festival) PARAGEM na apresentação de espectáculos, exposições, performances em espaços não-convencionais de Lagoa como: praias, eiras, adegas, campos de ténis, casas de férias, terraços e suites de hotel, procurando novas formas de comunicação entre as artes, artistas e os públicos.

Após conversas longas, debates acesos e reflexões amadurecidas, decidimos que o nosso mote curatorial será “(De) Férias no Algarve”. É imperativo confessar que esse leitmotiv não é fruto das circunstâncias, já que é um tema magnético que possibilita uma infinitude de abordagens e que, por isso, não morrerá na praia como os amores de verão, porquanto será explorado noutras PARAGENS em próximos futuros.

O que é estar de férias no Algarve? “Férias no Algarve”: o que nos vem à cabeça? Porque é que o Algarve é o destino eleito pela maioria dos portugueses e de muitos estrangeiros para as suas férias de verão? Será pelas praias? Será pela gastronomia? Será pelos sunset-parties? Será pelo calor tórrido afrodisíaco e acelerador da taxa de natalidade nacional nos meses de março, abril e maio no ano seguinte? Será pelos túneis de vento em que nos sentimos astronautas da NASA? Será pelas missas ao domingo ao fim do dia em versão bilingue com vista para o mar? Será pelo cheiro da vegetação seca? Será pela sinfonia das cigarras? Será pelos mergulhos em noites de lua cheia? Será por se poder nadar olimpicamente contra a linha do horizonte? Será pelos passeios de barco às Grutas de Benagil com acesso condicionado por semáforos? Será pelos contrastes palatinos do doce da Bola de Berlim e da água salgada ou do gelado a derreter com o ar quente? Será por aquilo que podemos fazer mais do que trabalhar para o bronze; a saber: ouvir a Marta Ren no Monte Santo Resort? Ou visitar as destilarias de medronho em Monchique? Ou visitar a FATACIL e ver a Blaya, não sem antes assistir aos shows hípicos? Ou tão só porque na maior parte dos destinos algarvios se está rodeado de milhares de pessoas e só o que muda é o cenário envolvente e isso é TOP!?

Contudo, e a começar logo por aí, há quem não goste disso. É o lado B reversível em que tudo muda. Para muitos, é definido como o dark side estival do Algarve. Estar sujeito à mesma pressão na vida de todos os dias cabe no conceito de férias? Seguramente que não. Como é que as pessoas lidam com isso? O que sucede quando o merecido descanso se confunde com os indesejáveis aumentos de stress e de ansiedade? Quais são as consequências de algo que não se deseja ser tão familiar ao longo do ano como o cansaço, o tédio, a decepção e o desgaste traumático que encaminham em direcção ao pesadelo, exaspero, a ressacas indesejadas e a estados anímicos depressivos, já que se imagina e projecta que as férias serão um período de recarga energética, prazer intensivo, lazer contínuo, álbuns de fotos apetecíveis e detonadores de likes, diversão máxima ou, para uma minoria residual, de aquisição de conhecimento e capital cultural (quanto mais geral e abrilhantador em reuniões e interacções sociais - tanto melhor! - para equilibrar o ratio entre custos e ganhos).

Interessa-nos explorar esse contrassenso que se nos afigura como decisivo para a criação artística e pensamento contemporâneos que se pode alimentar do confronto entre o desejo de compensação pelo sacrifício na busca da excitação e as nevroses e as agruras do mundo, enquanto potência da exploração poética entre essa condição de destino paradisíaco e, ao mesmo tempo, trágico em que a satisfação, por vezes, está muito aquém do que lhe era prometido e do que se auto-fantasiou.

Em busca desse fito, desafiámos artistas multidisciplinares a estarem de férias no Algarve em regime de part-time com trabalho versando sobre essa experiência efectiva ou imaginada. Eis os resultados. É nosso objectivo proporcionar dias efervescentes, arrepios na pele, sobressaltos emocionais, conclaves mágicos. Em suma: um caleidoscópio de paisagens-imagens-sensações-vislumbres que possam proporcionar umas férias artísticas encantadoras.

Resta-nos, por fim, desejar: - Boas mini-férias a todos aqueles que nos visitarem e que cedam à tentação de dizer que só pecaram por serem curtas.

Filipa Brito & Nelson Guerreiro
Directores Arísticos do Festival PARAGEM
promovido pela Bóia – Associação Cultural
(a salvar vidas desde 2018)